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Cinco décadas de poesia recuperada em «Sangue negro» (2001) de Noémia de Souza (PORTUGUÊS)

 Por: Rodrigo Arreyes

Traducción: Rodrigo Arreyes

Obra (imágen): Malangatana Ngwenya

Noémia de Souza é uma figura capital na história e na literatura de Moçambique: foi a primeira poeta negra a publicar no próprio pais e fez parte de uma forte resistência política contra a ingerência colonialista portuguesa, o que alimentou diretamente sua produção literária e periodística. Para isso, recorreu a constelação da língua portuguesa. Estudou no Brasil, produziu desde Portugal, colaborou com publicações angolanas. Rodrigo Arreyes nos adentra na difícil trajetória desta comprometida poeta, a partir de sua obra Sangue Negro (2001), antologia de sus poemas.


Três anos antes de assumir a presidência do país, durante a primeira Conferência da Mulher Moçambicana, em março de 1973, Samora Machel explicava que a emancipação da mulher não era um “ato de caridade” e que cada uma devia formar parte da luta armada para liquidar a opressão capitalista que esmagava o ser humano. O eixo principal da rebeldia era esse, não obter determinado status social de vida nem conseguir diplomas (por ele chamados «certificados de emancipação») nem ser promíscuas ou usar saias curtas. Nessa Conferência não existia «exploração da pessoa pela pessoa» em vez de «exploração do homem pelo homem». E ainda mais: Machel explicava que ele considerava vulgar pedir que o homem realizasse as mesmas tarefas que a mulher, pois antes era melhor que ela dirigisse um caminhão, por exemplo, ou que aprendesse a usar metralhadoras. Era esse um plano seguro para alcançar o fim da opressão da mulher pelo homem? Que fatos atravessavam as mulheres moçambicanas antes de participarem do congresso do futuro presidente? São perguntas para conhecer o tempo em que Noémia de Sousa não vivia em Moçambique.

 

Livre das convicções e das tradições do discurso de Machel: assim foi descrita por Cremilda de Araújo Medina quando entrevistada na ANOP (“Agência Noticiosa Portuguesa”) para o livro Sonha Mamana África. É curiosa a forma que em a crítica traça Noémia de Sousa. Antes de se desfazer em lágrimas, de Sousa conta que estava escrevendo um poema em homenagem a Samora Machel por causa do seu assassinato, a pedido do documentarista Camilo de Sousa, e que apenas respondia as perguntas da entrevistadora «nos intervalos do bombardeio do telex internacional», sendo «torturada pelos prazos de fechamento do noticiário». Dizia que não, «não escrevo poemas em uma terra que não é minha». Por fim, explicava que preferia ser mãe na Europa e que não voltaria para Moçambique. Esquecimento ou seja lá o que for, o que Cremilda de Araújo Medina semeia é uma reminiscência de um verso da própria Noémia: Ah, essa sou eu:/ órbitas vazias no desespero de possuir vida,/ boca rasgada em feridas de angústia,/ mãos enormes, espalmadas,/ erguendo-se em jeito de quem implora e ameaça,/ corpo tatuado de feridas visíveis e invisíveis/ pelos chicotes da escravatura…/ Torturada e magnífica,/ altiva e mística,/ África da cabeça aos pés,/- ah, essa sou eu.

 

Noémia de Sousa fugiu de Moçambique em 1951, antes da expulsão do poder colonial português. Fundadora de uma extensão do MUD (ligado ao Partido Comunista de Portugal), não formou parte da luta armada, porém seus poemas compunham um enfrentamento entre a cultura dos vivos e a cultura dos mortos em vida, como em “Deixem passar o meu povo”, sua tradução do título do spiritual negro de Harlem: E enquanto me vierem de Harlém/ vozes de lamentação/ e meus vultos familiares me visitarem/ em longas noites de insônia,/ não poderei deixar-me embalar pela música fútil/ das valsas de Strauss. Viveu exilada em Portugal e na França durante o resto da sua vida. Após desembarcar e ser recebida no porto por dois agentes da PIDE, meio século passaria até a publicação do seu primeiro poemário, Sangue Negro (2001). Contudo, apesar do tempo que desordena sua obra, em Moçambique não duvidaram em chamá-la de “mãe de todos os poetas de Moçambique”. Essa diferença fundamental a coloca como mais uma entre os poetas homens do seu pais. No caso do poeta moçambicano mais emblemático, José Craveirinha, apesar do seu destino de perseguido político, ele sim publicou diversas obras desde o primeiro período de perseguição política e cárcere até Maria, em homenagem à esposa que cuidava dos filhos enquanto ele sofria a reclusão. Os seus poemas divulgados pelo mundo foram reconhecidos com o prêmio Camões e então o proclamaram muito mais do que um “pai” dos poetas de Moçambique (por exemplo, conta Araújo Medina que Samora Machel se refugiava por vários dias acompanhado por Craveirinha ou que muitos moçambicanos o interpelavam porque a realidade revolucionária não se assemelhava às esperanças antes propostas pelos poemas).

 

Incentivada pelo intelectual Manuel Ferreira, Noémia de Sousa teve algumas oportunidades de publicar seus poemas em Lisboa, mas, segundo responde em 1986 a Araújo Medina, ela insistia em que sua obra fosse publicada em Moçambique. Por que não Portugal ou outro país europeu? Sendo assim, a Associação de Escritores de Moçambique editou Sangue Negro no seu país apenas em 2001.

 

Acaso foi a indiferença dos seus companheiros homens (ver o poema «Abri a porta companheiros») o que atrapalhou a publicação durante décadas ou foi só uma decisão pessoal de uma poeta em exílio, uma mulher do chamado terceiro mundo realocada no primeiro mundo?

 

Com a independência e o inicio do fim dos privilégios portugueses, depois da morte Eduardo Mondlane ao receber um livro-bomba, Samora Machel continuou no comando do seu povo no sonho marxista-leninista do hoje partido governante, o FRELIMO. Ao leste da África do Sul do apartheid, esse movimento popular armado começou a batalha de maior sucesso entre todas as batalhas contra séculos de invasões, sequestros e escravidão. Não foi somente uma revolta marxista apoiada pela infiltração da União Soviética, que combatia o imperialismo do pais vizinho. Nesse contexto, um país revolucionado com forte tradição oral e quase cem por cento de analfabetos (91% da população, de acordo com a historiadora Kathleen Sheldon), o início da trajetória de Noémia de Sousa conjugava-se com o aprofundamento da resistência negra, o marxismo internacional e o novo redemoinho de correntes literárias do Ocidente (Estados Unidos, Portugal, Brasil, por exemplo). Qual seria o significado desse trajeto de convicções e ligações da «mãe de todos os poetas de Moçambique?» A sua vida europeia não a europeizou, mas sim a formou em um cenário político armando «papagaios de papel» para o vento da vanguarda. A sua terra plurilíngue não transmitia a epopeia ocidental, a dos ditadores que louvavam a cultura europeia, os interesses econômicos sem identidade, as hierarquias religiosas ocidentais e as suas supostas escalas de humanismo. Muito pelo contrário, e como gostaríamos de explicar, mais, muito mais do que o contrário, lhe inspirava conexões locais tais como «A Billie Holiday, cantora” ou “Samba” e famoso “Súplica”. Sua poesia, apontada pela censura e pela crítica branca como “panfletária”, abre o caminho para que o Ocidente regresse seguindo os passos avançados: (…)com olhos bem de ver/ esse pedaço de pau preto / que um desconhecido irmão maconde/ de mãos inspiradas/ talhou e trabalhou/ em terras distantes lá do Norte.  Foi batizada “mãe” de uma geração de poetas em um país de poetas, onde o colonialismo oprimiu várias dessas culturas orais (às vezes matriarcais) como uma linguagem indesejável até as últimas consequências. Sobre o silenciamento foi construído o castelo de cartas civilizatório. A perigosa e legitimadora presença da língua das pessoas torturadas, humilhadas e perseguidas atravessa e moçambicaniza o português como um alimento contra as paredes de um estômago vazio, rompe as correntes dos seus mortos: Viemos…/E para além de tudo,/por sobre Índico de desespero e revoltas,/fatalismos e repulsas,/trouxemos esperança./Esperança de que a xituculumucumba já não virá/em noites infindáveis de pesadelo,/sugar com seus lábios de velha/nossos estômagos esfarrapados de fome,/ E viemos…./Oh sim, viemos!/Sob o chicote da esperança,/ nossos corpos capulanas quentes/embrulharam com carinho marítimos nômades de outros portos,/ saciaram generosamente fomes e sedes violentas…/ Nossos corpos pão e água para toda a gente./.

 

Embora a independência – e a literatura e o pensamento da independência – tenha sido iniciada por homens e mulheres como Noémia (excluída entre os excluídos: pobre, negra e mulher), perante o pedido da luta armada, a verdade é que o poder ficou na mão deles. Que forma de opressão era pior, o racismo ou o a do homem contra a mulher? Sofrer dois tipos de opressões supõe alguma divisão ou forma parte do mesmo em qualquer dimensão? Como somos capazes de ver essa inclinação e depois fixarmos um ponto, não outro e avançar como se nada tivesse acontecido? Com os poemas de Noémia de Sousa sentimos o movimento de uma intelectual e, além disso, exilada, que não duvidava que, mesmo que os feminismos fossem em teoria ou na prática uma causa do escravo (na divisão clássica do amo-escravo), não por isso era assumida por todos os homens escravizados (contra eles dirige a sua ironia em “Poema para Rui de Noronha”: Vens-me sangrando de teus amores, Poeta,/tens amores inumanos/ com desesperos suicidas e orgulhos brâmanes/ te tomando toda a vida de homem). Ao mesmo tempo, como a entrevistada no livro de Cremilda Araújo Medina, era uma embaixadora em um meio onde a causa contra o racismo e o colonialismo não se conjugava por conta própria com a luta das mulheres da metrópole.

 

Oferecemos aqui uma seleção de poesias da coletânea

 

Lição

Ensinaram-lhe na missão,
quando era pequenino:
“Somos todos filhos de Deus; cada Homem
é irmão doutro Homem!”

Disseram-lhe isto na missão,
quando era pequenino,

Naturalmente,
Ele não ficou sempre menino:
cresceu, aprendeu a conhecer
melhor essa mulher vendida
– que é a vida
de todos os desgraçados.

E então, uma vez, inocentemente,
Olhou para um Homem e disse “Irmão…”
Mas o Homem pálido fulminou-o duramente
com seus olhos cheios de ódio
e respondeu-lhe: “Negro”.

 

Deixa passar o meu povo

Noite morna de Moçambique
e sons longínquos de marimbas chegam até mim
– certos e constantes –
vindos nem sei eu donde.
Em minha casa de madeira e zinco,
abro o rádio e deixo-me embalar…
Mas vozes da América remexem-me a alma e os nervos.
E Robeson e Maria cantam para mim
spirituals negros do Harlém.
“Let my people go”
– oh deixa passar o meu povo,
deixa passar o meu povo! -,
dizem.
E eu abro os olhos e já não posso dormir.
Dentro de mim soam-me Anderson e Paul
e não são doces vozes de embalo.
“Let my people go!”

Nervosamente,
sento-me à mesa e escrevo…
Dentro de mim,
deixa passar o meu povo

“oh let my people go…”
E já não sou mais que instrumento
do meu sangue em turbilhão
com Marian me ajudando
com sua voz profunda – minha Irmã!
Escrevo…
Na minha mesa, vultos familiares se vêm debruçar.
Minha Mãe de mãos rudes e rosto cansado
e revoltas, dores, humilhações,
tatuando de negro o virgem papel branco.
E Paulo, que não conheço
mas é do mesmo sangue e da mesma seiva amada de Moçambique,
e misérias, janelas gradeadas, adeuses de magaíças,
algodoais, o meu inesquecível companheiro branco.
E Zé – meu irmão – e Saúl,
e tu, Amigo de doce olhar azul,
pegando na minha mão e me obrigando a escrever
com o fel que me vem da revolta.
Todos se vêm debruçar sobre o meu ombro,
enquanto escrevo, noite adiante,
com Marian e Robeson vigiando pelo olho luminoso do rádio
– “let my people go
oh let my people go!”

E enquanto me vierem do Harlém
vozes de lamentação
e meus vultos familiares me visitarem
em longas noites de insônia,
não poderei deixar-me embalar pela música fútil
das valsas de Strauss.
Escreverei, escreverei,
com Robeson e Marian gritando comigo:
Let my people go
OH DEIXA PASSAR O MEU POVO!

 

A BILLIE HOLIDAY, CANTORA

 

Era de noite e no quarto aprisionado em escuridão
apenas o luar entrara, sorrateiramente,
e fora derramar-se no chão.
Solidão. Solidão. Solidão.
E então,
tua voz, minha irmã americana,
veio do ar, do nada nascida da própria escuridão…
Estranha, profunda, quente,
vazada em solidão.
E começava assim a canção:
“Into each heart some rain must fall…”
Começava assim
e era só melancolia
do princípio ao fim,
como se teus dias fossem sem sol
e a tua alma aí, sem alegria…

Tua voz irmã, no seu trágico sentimentalismo,
descendo e subindo,
chorando para logo, ainda trêmula, começar rindo,
cantando no teu arrastado inglês crioulo
esses singulares “blues”, dum fatalismo
rácico que faz doer
tua voz, não sei porque estranha magia,
arrastou para longe a minha solidão…

No quarto às escuras, eu já não estava só!
Com a tua voz, irmã americana, veio
todo o meu povo escravizado sem dó
por esse mundo fora, vivendo no medo, no receio
de tudo e de todos…
O meu povo ajudando a erguer impérios
e a ser excluído na vitória…
A viver, segregado, uma vida inglória,
de proscrito, de criminoso…
O meu povo transportando para a música, para a poesia,
os seus complexos, a sua tristeza inata, a sua insatisfação…
Billie Holiday, minha irmã americana,
continua cantando sempre, no teu jeito magoado
os “blues” eternos do nosso povo desgraçado…
Continua cantando, cantando, sempre cantando,
até que a humanidade egoísta ouça em ti a nossa voz,
e se volte enfim para nós,
mas com olhos de fraternidade e compreensão!
Abri a porta, companheiros

Ai abri-nos a porta,
abri-a depressa, companheiros,
que cá fora andam o medo, o frio, a fome,
e há cacimba, há escuridão e nevoeiro…
Somos um exército inteiro,
todo um exército numeroso,
a pedir-vos compreensão, companheiros!

E continua fechada a porta…

Nossas mãos negras inteiriçadas,
de talhe grosseiro
– nossas mãos de desenho rude e ansioso –
já cansam de tanto bater em vão…

Ai companheiros,
abandonai por momentos a mansidão
estagnada do vosso comodismo ordeiro
e vinde!
Ou então,
podeis atirar-nos também,
mesmo sem vos moverdes,
a chave mágica, que tanto cobiçamos…
Até com humilhação do vosso desdém,
nós a aceitaremos.

O que importa
é não nos deixarem a morrer,
miseráveis e gelados,
aqui fora, na noite fria povoada de xipócués…
“o que importa
é que se abra a porta.”

 

 

Patrão

 

Patrão, patrão, oh meu patrão!
Porque me bates sempre, sem dó,
com teus olhos duros e hostis,
com tuas palavras que ferem como setas
com todo o teu ar de desprezo motejador
por meus atos forçadamente servis,
e até com a bofetada humilhante na tua mão?

Oh, mas porquê, patrão? Diz-me só:

que mal te fiz?
(Será o ter eu nascido assim com esta cor?)
Patrão, eu nada sei… Bem vês

que nada me ensinaram,
só a odiar e obedecer…
Só a obedecer e odiar, sim!
Mas quando eu falo, patrão, tu ris!
e ri-se também aquele senhor
patrão Manuel Soares do Rádio Clube…
Eu não percebo o teu português,
patrão, mas sei o meu landim,
que é uma língua tão bela
e tão digna como a tua, patrão…

No meu coração não há outra melhor,
tão suave e tão meiga como ela!
Então porque te ris de mim?
Ah patrão, eu levantei

esta terra mestiça de Moçambique
com a força do meu amor,
com o suor de meu sacrifício,
com os músculos da minha vontade!
Eu levantei-a, patrão
pedra por pedra, casa por casa,
árvore por árvore, cidade por cidade,
com alegria e com dor!
Eu a levantei!

E se o teu cérebro não me acredita,

pergunta à tua casa quem fez cada bloco seu,
quem subiu aos andaimes,
quem agora limpa e a põe tão bonita,
quem a esfrega e a varre e a encerra …

Pergunta ainda às acácias vermelhas e sensuais
como os lábios das tuas meninas,
que as plantou e as regou,
e, mais tarde, as podou…
Pergunta a todas essas largas ruas citadinas,
simétricas e negras e luzidias
quem foi que as alcatroou,
indiferente à malanga de sol infernal…
E também pergunta quem as varre ainda,
manhã cedo, com a cacimba a cobrir tudo
Pergunta quem morre no cais
todos os dias – todos os dias -,
para voltar a ressuscitar numa canção …
E quem é escravo nas plantações de sisal
e de algodão,
por esse Moçambique além …
O sisal e o algodão que hão de ser “pondos” para ti
e não para mim, meu patrão …
E o suor é meu,
a dor é minha,
o sacrifício é meu,
a terra é minha
e meu também é o céu!

 

E tu bates-me, patrão meu!
bates-me …
E o sangue alastra, e há de ser mar…

Patrão, cuidado,
que um mar de sangue pode afogar
tudo … até a ti, meu patrão!
Até a ti …

 

NOSSA VOZ

 

Ao J. Craveirinha

 

Nossa voz ergueu-se consciente e bárbara

sobre o branco egoísmo dos homens

sobre a indiferença assassina de todos.

Nossa voz molhada das cacimbadas do sertão

nossa voz ardente como o sol das malangas

nossa voz atabaque chamando

nossa voz lança de Maguiguana

nossa voz, irmão,

nossa voz trespassou a atmosfera conformista da cidade

e revolucionou-a

arrastou-a como um ciclone de conhecimento.

 

E acordou remorsos de olhos amarelos de hiena

e fez escorrer suores frios de condenados

e acendeu luzes de esperança em almas sombrias de desesperados…

 

Nossa voz, irmão!

nossa voz atabaque chamando.

 

Nossa voz lua cheia em noite escura de desesperança

nossa voz farol em mar de tempestade

nossa voz limando grades, grades seculares

nossa voz, irmão! nossa voz milhares,

nossa voz milhões de vozes clamando!

 

Nossa voz gemendo, sacudindo sacas imundas,

nossa voz gorda de miséria,

nossa voz arrastando grilhetas

nossa voz nostálgica de ímpis

nossa voz África

nossa voz cansada da masturbação dos batuques da guerra

nossa voz gritando, gritando, gritando!

Nossa voz que descobriu até ao fundo,

lá onde coaxam as rãs,

a amargura imensa, inexprimível, enorme como o mundo,

da simples palavra ESCRAVIDÃO:

 

Nossa voz gritando sem cessar,

nossa voz apontando caminhos

nossa voz xipalapala

nossa voz atabaque chamando

nossa voz, irmão!

nossa voz milhões de vozes clamando, clamando, clamando.